[MÚSICA] [MÚSICA]
No vídeo anterior, vimos algumas das
relações existentes entre jogos e cultura, com base teóricos como Huizinga e Suits.
Foram expostos alguns pontos interessantes a respeito da desvalorização tanto
dos jogos quanto da arte, quando não são levadas conta nessa valoração,
as experiências subjetivas do jogar e da fruição artística.
Agora nós vamos conhecer pouco a respeito da relação entre os jogos e a arte.
Primeira pergunta que pode surgir quando começamos uma discussão desse porte é:
"Afinal, o que é arte?" Quando começamos a falar sobre jogos,
vimos algumas definições diferentes a respeito da origem das atividades lúdicas.
Essa seria uma das abordagens para se compreender e se
explicar o que são os jogos.
No final das contas, ficamos com a definição de Suits sobre os jogos serem:
"Atividades direcionadas por objetivos nas quais o emprego de meios
ineficientes é intencionalmente escolhido." Essa é uma das muitas
definições existentes sobre o que seriam os jogos.
Foi a definição selecionada, pela sua adequação com o recorte desse trabalho.
No caso da arte, acontece o mesmo.
Alguns estudiosos tentam explicar o que seria a arte, ao trazer uma espécie de
arqueologia da arte, falando da origem da necessidade humana de se expressar,
geralmente partindo de apresentações das pinturas rupestres.
Outros, partem da historiografia da arte, contando a história da arte
através de uma reconstrução da vida dos artistas ou dos movimentos artísticos.
Isso tudo ajuda a traçar panorama do que vem sendo considerado como
arte ao longo dos séculos.
Porém, a resposta da pergunta "O que
é arte?" está longe de ser conseguida com exatidão,
simplesmente porque a experiência artística é algo muito subjetivo.
A maneira como uma pessoa percebe objeto artístico será completamente
diferente da maneira como uma outra pessoa experimenta o mesmo objeto.
Isso acontece porque as pessoas constroem repertório de valores que é diretamente
influenciado pelo contexto no qual elas vivem.
As pessoas sofrem influência da sociedade na qual estão inseridas,
do sistema educacional pelo qual passaram, do seu núcleo familiar,
dos veículos de informação ao qual são expostas, dentre muitas outras variáveis.
Então o que pode ser uma experiência artística incrível para alguns,
pode não fazer o menor sentido para outros.
Isso tudo acaba dando margem à uma dedução bem arriscada.
Então tudo é arte?
Não é bem assim.
Nós veremos mais adiante que a definição de arte vai se construindo
sobre a proposição de paradigmas.
Esses paradigmas fazem muito sentido no momento que são propostos, porém precisam
ser revistos constantemente e substituídos para atender as demandas do seu tempo.
Resumindo, dos maiores problemas quando vamos construir
pensamento que enxergue os videogames como arte acontece quando buscamos uma
definição do que é arte num momento que os videogames sequer existiam.
O que era arte no período clássico, por exemplo,
restringia muito o que poderia ser feito termos de estética e suporte material,
que fazia sentido para aquela época.
Hoje podemos construir objetos artísticos partindo de uma infinidade de suportes.
A maneira que consumimos arte e o porquê de consumirmos arte
mudou completamente comparação com aquele período.
Segundo Walter Benjamin a evolução da capacidade de reprodução das obras de
arte foi a maior responsável para que o consumo de arte se modificasse.
[MÚSICA]
[MÚSICA] Se
antes uma obra era literalmente única, original e autêntica, atualmente
convivemos com a propagação massiva de objetos de arte e produtos culturais.
Esse rompimento com o conceito de autenticidade,
é observado por Benjamin quando ele menciona a fotografia.
Na fotografia, a autenticidade não está no modelo fotografado, no papel da revelação,
ou mesmo no tipo de câmera utilizada para se produzir a imagem si.
A ideia da autenticidade estará no olhar do artista,
na escolha do enquadramento, no momento exato do clique, que congela uma cena.
A fotografia, e mais tarde, o cinema, trouxe a possibilidade da reprodução,
da cópia, algo verdadeiramente revolucionário para o século XIX.
Até então, as obras de arte eram feitas por artistas que representavam o arquétipo
do gênio artístico.
Tais obras eram mantidas locais específicos,
longe da visitação do público geral.
Eram obras feitas por poucos, para os olhos de poucos.
A capacidade de reprodução tornou esse acesso mais democrático,
rompendo com as características de culto envolvendo as obras de arte.
Isso ajudou a desmistificar pouco o modo como a arte é apreciada.
É interessante observar como a história se repete desde o século XIX,
quando se questionava o valor artístico da fotografia comparação com a pintura.
No século XX, o mesmo aconteceu com relação à linguagem cinematográfica
comparação ao teatro ou à ópera.
Aqui estamos no século XXI,
meio a várias discussões a respeito do valor artístico dos videogames.
A cada ciclo, a cada nova tecnologia aplicada ao campo das artes,
é necessário compreender que a definição do que é arte também se atualiza.
A democratização do acesso às obras de arte e a destruição do mito do
gênio artístico tiveram como consequência aumento na produção de arte.
Benjamin comenta, por exemplo, as mudanças no setor da literatura.
Se, num primeiro momento, o número de autores era muito menor com relação ao
número de leitores, com a popularização da leitura e com a expansão da imprensa,
o número de escritores cresceu consideravelmente.
Mais tarde o mesmo aconteceu com os filmes.
Por que isso importa?
Quanto menor o número de autores, produzindo e disseminando conteúdo,
menor a variedade.
São poucos contando suas histórias,
mostrando o mundo através do seu ponto de vista particular.
Com o crescimento no número de criadores,
o público, que também é variado, passou a se ver mais representado.
A diferença entre autor e público diminuiu,
se tornou mais e mais difusa, a ponto de hoje, graças à internet,
se alternarem os papéis da audiência e da produção.
No caso dos videogames, observamos o mesmo fenômeno se desenrolando.
Com uma maior variedade de ferramentas de criação, algumas gratuitas para testar,
outras sobre os princípios do software livre,
a cena independente de criadores de games tem criado propostas que exploram
diferentes expressões de arte, histórias e entretenimento.
Essa movimentação vem no sentido oposto à indústria dos videogames,
cada vez mais voltada para o consumo massivo.
Quantidade facilmente passou a ser confundida com qualidade, pois games com
grande número de consumidores costumam ser ovacionados depois de julgamento sumário.
Isso pode ser prejudicial por dois motivos.
Por lado, game que seja sucesso de público pode ganhar status de arte antes
mesmo que se faça uma reflexão crítica a respeito do seu valor expressivo.
Por outro lado, caso esse game represente realmente uma expressão artística digna
de nota, a sua popularidade pode ficar no caminho desse tipo de reconhecimento.
Pelo simples fato de ser sucesso de público,
ele correria o risco de ser visto como entretenimento vazio,
principalmente pela crítica especializada nos setores de cultura e de artes.
Esse dilema tem a ver com a concepção antiga de que para se
apreciar a arte é necessário recolhimento.
Segundo essa ideia,
as massas procurariam entretenimento rápido e superficial apenas.
Benjamin usa exemplo que pode nos trazer a resposta para esse impasse.
Ele disse que na arquitetura existiria uma intenção artística,
que seria recebida pelo público de maneira distraída e coletiva.
O sujeito poderia apreciar o trabalho arquitetônico recolhimento,
como quando você para na frente de prédio histórico numa viagem turística.
Porém, ele também poderia apreciar esse mesmo trabalho de maneira
tátil ou funcional, transitando pelo ambiente, acompanhado de outras pessoas.
Essa ideia de recepção distraída da obra
combina perfeitamente com os meios do cinema e do videogame.
Não há temor ou respeito,
culto intelectual a uma obra que está num lugar especial e silencioso como museu.
O que existe é uma relação direta,
com público que toma uma atitude muito mais crítica diante da obra.
E como o público se torna a própria crítica, existe uma grande resistência
por parte dos puristas compreender a relação entre cultura, arte e videogames.
No final das contas, a interação do público com a tecnologia altera o que
se conhece como arte e também a forma que essa mesma arte é consumida e criticada.
Com essa reflexão, encerramos o nosso primeiro módulo.
Vimos a problemática da questão do que é arte e o porquê dessa pergunta precisar
ser feita ao longo dos anos.
A resposta também varia função do contexto social no qual estamos inseridos.
Começamos a compreender também que a arte
não possui uma maneira única de ser percebida e apreciada.
Ela pode ser contemplada dentro de uma galeria ou de museu, mas também pode
ser consumida rapidamente, ou até mesmo através da chamada recepção distraída.
A seguir, veremos mais detalhes, alguns dos paradigmas da arte.
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